O movimento é a primeira linguagem da criança. Antes mesmo de articular palavras, ela já se comunica com o corpo: engatinha para alcançar um brinquedo, estende os braços em busca de colo, sorri e se mexe para demonstrar alegria. O gesto vem antes da fala — e, muitas vezes, é a principal forma de expressão dessa infância tão rica e cheia de descobertas.
A criança é como uma tela em branco: cada experiência, cada contato com o mundo vai pintando o seu universo interior. O aprendizado nasce do movimento, do toque, da interação e da curiosidade em explorar o meio. Quanto mais movimento, mais conexões cerebrais se formam, mais sentidos se despertam, mais inteligência se desenvolve.
Nesse processo, a Educação Física ocupa um papel fundamental: ela não apenas constrói um currículo motor — a base de gestos, habilidades e movimentos que servirão para toda a vida —, mas também ajuda a criança a reconhecer o próprio corpo, perceber o outro e compreender o espaço ao seu redor. É através da prática que a criança fortalece sua autoestima, descobre do que é capaz, aprende a lidar com desafios e a respeitar limites.
Mas para além da escola, em tempos de excesso de telas, é preciso lembrar que nenhuma imagem digital substitui o cheiro da terra molhada, a sensação de montar um brinquedo novo ou imaginar um cenário inteiro na imaginação, o toque da areia nos pés ou o ato de correr livre pelo quintal. O corpo é a primeira escola da criança, e o mundo é o seu maior laboratório.
Rubem Alves nos lembra: “Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra.” — e poderíamos dizer também, pela magia do movimento. Quando damos às crianças a oportunidade de se mexer, brincar e explorar, ensinamos não apenas habilidades motoras, mas também formas de se conhecer, de se relacionar e de compreender a vida.
Por isso, tire a criança da tela e leve-a para o mundo: cada passo, cada gesto e cada brincadeira são pinceladas na construção do seu próprio universo.
É urgente olhar para os números alarmantes de obesidade infantil e de doenças decorrentes do sedentarismo. Cada vez mais cedo, crianças apresentam sinais de hipertensão, diabetes tipo 2 e problemas ortopédicos ligados à falta de movimento. A ausência de experiências corporais e motoras não compromete apenas a saúde física, mas também a emocional e cognitiva, limitando o desenvolvimento pleno. Garantir que a criança se movimente, brinque e pratique atividades físicas não é apenas lazer: é uma questão de saúde pública e de futuro. Garantir o movimento é amar a criança genuinamente!
Colaborou neste artigo a Profª Drª Maria Carolina Traina Gama (dra_carolgama):
Possui graduação em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba (2005) e pós graduação na Universidade Gama Filho Campinas (2009). Mestrado e Doutorado em Ciências da Nutrição e do Esporte e Metabolismo, na área de Biodinâmica do Movimento e Esporte pela Faculdade de Ciências Aplicadas - FCA na Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP/Limeira. Laboratório de Fisiologia Aplicada ao Esporte - LAFAE (2019). Experiência como Professora Substituta na Universidade Federal do Ceará - UFC nas áreas de Metodologia do Treinamento Aplicada a Atividade Física e Estágio Supervisionado (2021-2023). Atualmente é Professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE) na área da Biodinâmica do movimento. É integrante do Grupo de Pesquisa em Treinamento e Avaliação Neuromuscular (GPTAN - IEFES/UFC) e do Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Esportes de Raquete (GRIPER - FEF/UNICAMP). Comissão Científica da Confederação Brasileira de Tênis de mesa (CBTM).